Autor: Fábio ACM

  • Eddi MC lança três novos singles e reafirma a força do rap da Baixada Fluminense

    Eddi MC lança três novos singles e reafirma a força do rap da Baixada Fluminense

    Rapper de Belford Roxo retoma carreira solo com músicas inéditas disponíveis nas plataformas digitais

    Por DJ Fábio ACM

    Eddi MC, um dos pioneiros do hip hop na baixada fluminense do Rio de Janeiro, está de volta à cena musical com o lançamento de três faixas inéditas nas plataformas digitais. Conhecido por fundar a banda Nocaute ao lado de Nino Rap, indicada ao Grammy Latino em 2002, Eddi MC segue fiel à missão de valorizar a cultura periférica e denunciar as desigualdades sociais por meio da música.

    Natural de Belford Roxo, Eddi começou sua trajetória nos anos 1980, em meio ao boom do reggae na Baixada, mas foi fisgado pelo rap ainda jovem. Com uma carreira marcada por engajamento político, ações sociais e projetos literários, o rapper nunca se afastou da arte. Agora, ele se reinventa em carreira solo, com produção independente, e mostra que sua mensagem segue atual e raiz.

    “Éramos Reis”: diálogo Brasil-África sobre racismo e resistência

    Link: https://open.spotify.com/intl-pt/track/1vNfLocSuswr3MomNvwwWO?si=47ebe387b6764746

    A primeira faixa lançada, “Éramos Reis”, é uma parceria internacional com o rapper moçambicano BIG MASTER C. Produzida por Bira Andrade, a música carrega uma lírica combativa e poética, denunciando o racismo estrutural. O encontro entre os dois artistas – um brasileiro, outro africano – reafirma os laços históricos de um povo que resiste e reivindica seu legado:

    “Éramos reis, e hoje são poucos os presidentes.
    Éramos reis no nosso continente, Brasil do procedente
    (…)
    Ao redor do mundo, ao redor do planeta
    A cor do dinheiro quase nunca é nota preta”

    O encontro entre as vozes de Eddi e Big Master C, reconhecido como “o rapper mais ligeiro da África”, une dicção afiada com consciência crítica, num diálogo entre continentes unidos por história e luta.

    “A Baixada Nunca Se Rende”: poesia da favela vira canção

    Link: https://open.spotify.com/intl-pt/track/1h1jGEj1dFtHX59yZ6t9CU?si=0ddb4d5235144347

    A segunda música, “A Baixada Nunca Se Rende”, nasce de um poema da veterana Celeste Estrela, artista mineira radicada há mais de 40 anos na favela de Manguinhos. A faixa, com produção de Du-Brown, mistura ritmos da música nordestina — zabumba e triângulo — com batidas eletrônicas da Roland 808, criando um rap híbrido e poderoso.

    “A Baixada sonha com igualdade social
    A baixada não se rende, não
    A baixada quer carinho, quer amor e atenção”

    Celeste, autora do livro Coroação Preta, é símbolo da resistência cultural da favela, e sua colaboração com Eddi MC reforça a pluralidade de vozes que compõem o cenário artístico da Baixada. A canção é um hino à periferia, à luta por dignidade e ao afeto que nasce em territórios constantemente estigmatizados.

    “Beatbox – o sexto elemento”: rap e rock para celebrar o hip hop

    Link: https://open.spotify.com/intl-pt/track/55dQUuu27OE74yD0WyVt86?si=15a4c503eafe4c5f

    A terceira novidade é “Beatbox – o sexto elemento”, faixa que reúne o rap com o rock — marca da antiga banda Nocaute — e presta homenagem ao beatbox, elemento fundamental da cultura hip hop. Produzida por Du Brown, a música conta com a participação do guitarrista Jailson Lisboa, também da Baixada (São João de Meriti), e evoca a tradição de unir estilos como fizeram Run DMC e Aerosmith em 1986.

    “Rap, DJ, break, conhecimento, grafite, beatbox – sexto elemento
    O beatbox dá um clima na roda
    Bota as ruas no centro, por isso que incomoda”

    A faixa celebra a inventividade do beatbox como caixa de som humana e reforça o papel do hip hop como movimento educacional e ancestral.
    Ainda sobre o Beatbox, Eddi MC lançou em 2007 o curta-metragem Beat Box – O Sexto Elemento, produzido de forma independente no morro do Cantagalo, no Rio de Janeiro. O filme registra uma versão do Hino Nacional em ritmo do rap, interpretada por crianças de um projeto social da comunidade. Com menos de 15 minutos, o curta foi exibido em festivais no Brasil e na Holanda, e reforça o poder transformador da cultura hip hop e das tecnologias acessíveis no audiovisual.

    Para assistir, acesse o link: https://www.youtube.com/watch?v=bF5TN-78YVI

    Resistência, arte e história viva

    Além das novas músicas, Eddi MC segue ativo como escritor e militante cultural. Ele é autor de um capítulo no livro A Força das Falas Negras e integra o coletivo Baixada Nunca Se Rende, voltado à valorização dos artistas e da produção cultural da região.

    O retorno de Eddi MC não é apenas musical: é um manifesto. Sua voz ecoa por escolas, favelas e centros culturais da Baixada, reafirmando que o hip hop continua sendo ferramenta de transformação e resistência.

    Os três singles já estão disponíveis nas principais plataformas de streaming. Para quem acompanha a história do rap nacional e valoriza a força da cultura periférica, esse é um retorno que merece ser celebrado — e ouvido no volume máximo.

    Sobre o Beatbox: a bateria humana da cultura Hip Hop

    O beatbox é uma forma singular de expressão musical, nascida dentro da cultura Hip Hop nos anos 1980, em Nova York. Trata-se da arte de criar batidas, ritmos e sons apenas com o uso da boca, lábios, língua, garganta e passagem nasal. Segundo Kuhns (2014), o beatbox simula os elementos da percussão, utilizando o corpo como instrumento — por isso, também é conhecido como instrumento humano. Geralmente, é praticado por MCs e outros integrantes do Hip Hop que exploram ao máximo as possibilidades sonoras da voz.

    Inspirado nas drum machines, caixas eletrônicas de ritmo que eram caras e inacessíveis à juventude negra e periférica, o beatbox surgiu como uma alternativa criativa e acessível. Daí vem o nome “Human Beatbox”: pessoas que imitavam os sons dessas máquinas com a própria voz.

    Artistas como Doug E. Fresh e Darren “Buffy” Robinson, do grupo Fat Boys, foram pioneiros no uso da técnica, ajudando a expandir sua popularidade e sofisticação. Outros nomes como Bobby McFerrin também contribuíram para o desenvolvimento da arte vocal em outros gêneros, como o jazz.

    No Brasil, o beatbox ganhou força a partir dos anos 1990 e 2000, com nomes como Fernandinho Beatbox, de São Paulo, e Fábio Carrão, do Rio de Janeiro, que se destacaram em batalhas, shows e oficinas educativas, formando gerações de novos beatboxers.

    Os elementos básicos do beatbox são o bumbo, a caixa e o chimbal. O bumbo é produzido com pressão labial e explosão de ar ao pronunciar letras como “p” ou “b”. A caixa vocal se aproxima do som agudo de uma tarola, usando variações como “pf”, “psh” ou “ps”. Já o chimbal simula pratos de bateria e pode ser criado com as consoantes “t”, “k” ou “ch”.

    Referências:
    BETHÔNICO, Jalver. Beatbox em Loop: Crescimento de ideias e seu desdobramento na arte digital e no design sonoro. Texto Digital: Florianópolis, v. 5, n 1, p.248-275, jul. 2013.
    DEHNHARD, Tilmann. Tilmann Dehnhard: Flutebeatboxing for flute. Universal Edition, 2015.
    KUHNS, Christopher. Beatboxing and flute: Its history, repertoire, and pedagogical importance. Tese de doutorado em música, Frorida State University College of Music, Florida, 2014.
    VÁZQUEZ, Óscar. Método de Flutebox: El método para aprender y enseñar flauta beatbox. Espanha, Guzmán el bueno, 2017.
    Revista África e Africanidades – Ano I – n. 2 – Agosto. 2008 – ISSN 1983-2354
    LUDDENS, Douglas. Celeste Estrela. Wiki Favelas – Dicionário de Favelas Marielle Franco.

    Disponível em: https://wikifavelas.com.br

  • Ritual Sonoro estreia com “Unidade” e celebra a força ancestral da música preta brasileira

    Ritual Sonoro estreia com “Unidade” e celebra a força ancestral da música preta brasileira

    Coletivo de Brasília lança seu primeiro single no Dia do Trabalhador, fundindo reggae, hip hop e espiritualidade com mensagem potente contra o racismo

    Uma estreia com propósito

    O coletivo Ritual Sonoro lançou, em 1º de maio, o single “Unidade”, que marca sua estreia oficial no cenário musical. Produzida por DJ Fábio ACM, é um manifesto que une beats digitais, tambores ancestrais e letras que evocam a força da cultura afro-brasileira.

    “A criação do coletivo Ritual Sonoro se dá na virada de 2023 para 2024, de um jeito informal. É fruto de dez anos de parceria minha com o Erik Schnabel. A gente foi forjando essa amizade, essa sociedade, até o momento de consolidar em um projeto maior”, conta Pleno, idealizador e MC do grupo.

    Reggae e Hip Hop como caminhos para a ancestralidade

    Erik Schnabel, também fundador do coletivo, reforça que o projeto é o resultado de uma longa trajetória:

    “O reggae foi minha primeira escola, abracei o estilo como forma de expressão. E quando me envolvi com o hip hop, ao ver a roda, o improviso, a ideologia, via paralelos com outras manifestações afro-diaspóricas”.

    Segundo ele, Unidade nasceu de uma imersão pessoal e criativa.

    “Quando a inspiração veio mesmo, foi em uma madrugada. Me imaginei num cenário metafórico e fui descrevendo o que via, tentando agregar significados. Unificar símbolos da resistência indígena, afro-brasileira, de reconexão e resistência”, relata Schnabel.

    Um projeto coletivo que nasce das vivências

    O Ritual Sonoro se consolidou como coletivo, selo, banda e movimento cultural. A proposta é promover uma cena musical ligada à ancestralidade, à espiritualidade e à luta contra o racismo, unindo artistas de diferentes origens em torno da música como ferramenta de transformação social.

    “A gente começou a atuar com produção de eventos, misturando nossos trabalhos e levando nossos códigos. E, ao conhecer o DJ Fábio ACM, conseguimos expandir para a música autoral e gravar nosso primeiro volume”, afirma Pleno.

    “Ritual Sonoro é fruto de várias vivências e de outras iniciativas que ensinaram muito. Um selo, uma marca, uma banda. Nosso lema é ser a ponte entre o roots e o digital”, completa Erik.

    Lançamento e próximos passos

    Unidade conta com vocais de Afroragga, além de Pleno e Schnabel. A faixa abre caminho para o primeiro álbum do coletivo, previsto para sair ao longo de 2025, com cinco faixas e participações de artistas do DF, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e Jamaica.

    “A letra da Unidade é inspirada em um estudo sobre a história brasileira. Não tem como falar de cultura de resistência sem falar de racismo. Onde o Ritual Sonoro tiver, é fogo nos racistas”, enfatiza Pleno.

    Show gratuito em Brasília

    O primeiro evento de lançamento com o novo material acontece no dia 17 de maio, no espaço Baixo Norte – Livros & Discos, na 411 Norte de Brasília. O encontro terá entrada gratuita e contará com roda de conversa, discotecagem com DJ Fábio ACM, pocket show e audição exclusiva de outras faixas do álbum.

    SERVIÇO

    Baixo Norte Convida Ritual Sonoro
    📍 Local: Baixo Norte – SQN 411 Norte, Bloco E, Loja 29 – Brasília
    📅 Data: 17 de maio (sábado)
    🕓 Horário: 16h às 22h
    🎟 Entrada: Gratuita
    🔊 Atrações: Roda de conversa, DJ set, show e audição de músicas do álbum

    Acompanhe e apoie
    Ritual Sonoro: @ritualsonoro
    Pleno: @plenomc
    Erik Schnabel: @schnabel.music
    Afroragga: @afroraggafm

    https://open.spotify.com/track/7alkNOPm5X9zryUAJDKlOo?si=CNqCG07DRKSAHvyNglvx7Q

  • O Hip Hop brilhou e celebrou no Festival de Hip Hop do Cerrado

    O Hip Hop brilhou e celebrou no Festival de Hip Hop do Cerrado

     A 6ª edição aconteceu como parte das comemorações dos 54 anos da Ceilândia

    Por DJ Fábio ACM e Giovana Gomes

    Era um sábado de previsão de chuva, mas Ceilândia decidiu que o tempo seria outro. As nuvens se seguraram e deram espaço para o brilho do sol, da rima, da batida e do povo. Na Praça do Cidadão, coração pulsante da quebrada, o 6º Festival de Hip Hop do Cerrado tomou forma como um reencontro histórico — e eu, DJ Fábio ACM, tive a honra de estar lá, vivendo cada momento.

    Gente de todas as regiões do Distrito Federal se juntou naquele chão sagrado do Hip Hop. Não era só um festival. Era um chamado. Um ato de celebração, resistência e pertencimento. Ali, os quatro elementos estavam em comunhão: os b-boys e b-girls dançavam no chão, rolaram até os clássicos “passinhos”, MCs rimando, os DJs comandando a festa e o graffiti, nas paredes do Jovens de Expressão estampava a alma da Ceilândia.

    O camarim não era apenas um bastidor — era um terreiro de afeto, onde a energia entre os artistas era de verdadeira congregação. Ali, cada olhar, cada abraço e cada conversa trazia a certeza de que estávamos fazendo parte de algo maior. Estávamos continuando uma história, escrevendo mais uma página de luta, arte e identidade periférica.

    DJ Fábio ACM & DJ Raffa Santoro
    DJ Fábio ACM & DJ Raffa Santoro

    No centro de tudo isso, um nome: DJ Raffa Santoro. Um dos maiores nomes do Hip Hop nacional. Produtor premiado, DJ de respeito, mestre e inspiração. O culpado — sim, culpado com orgulho — por revelar tantos talentos e por, mais uma vez, reunir o Brasil do Hip Hop na Ceilândia. Ele, filho do maestro Claudio Santoro e da bailarina Gisele Santoro, é a soma perfeita de técnica e paixão. Viveu o exílio com a família na Alemanha, mas voltou pra Brasília e fez da cidade sua bandeira. B-boy, músico, radical, popular, periférico. Raffa é parte viva da nossa história. Seu livro “Trajetória de um Guerreiro” não é só um relato biográfico, é um documento do Brasil que rima, dança, canta e resiste.

    E resistimos. Após 11 anos de pausa, o Festival de Hip Hop do Cerrado voltou. E voltou gigante. A 6ª edição aconteceu como parte das comemorações dos 54 anos de Ceilândia — a capital do Hip Hop do DF, berço de grupos como Viela 17, Cirurgia Moral, Álibi, Câmbio Negro, Tropa de Elite e lendas como Japão e DJ Jamaika. Essa cidade, que transformou a dor em arte e a periferia em potência, merecia — e recebeu — um evento à altura.

    A Praça do Cidadão virou palco de um espetáculo que reuniu Viela 17, Atitude Feminina, MC Marechal (RJ), Cinthia Savoy (baiana radicada em Florianópolis), F-Dois (Porto Velho, RO), VK (MC de Florianópolis, filho do DJ Monkey), DJ Buiu, DJ Monkey e, claro, ele: G.O.G. — lenda viva do Hip Hop do DF, um dos momentos mais esperados da noite, e que levou o público ao delírio com sua presença.

    O festival contou com estrutura de alto nível: painéis de LED, experiências multimídia, lounge, food trucks e entrada gratuita. E mesmo com os ingressos esgotados, o público compareceu em peso. Foi emocionante.
    Do palco, vieram as rimas, as batidas e os scratchs. E também vieram as lembranças. Em um dos momentos mais marcantes da noite, o festival prestou homenagens póstumas a dois ícones que já partiram, mas seguem vivos na história do Hip Hop brasileiro: DJ Celsão, do grupo Cirurgia Moral, e DJ Jamaika. A reverência foi justa, merecida e comovente. A memória deles vive em cada batida, em cada verso, em cada jovem que hoje ocupa o microfone e o toca-discos.

    Eu estive lá com minha amiga Giovana Gomes, que além de parceira de trampo no jornalismo, é apaixonada por Hip Hop e ajudou a trazer um pouco do protagonismo das mulheres no Hip Hop do Distrito Federal.

    A mulher no Rap

    Por Giovana Gomes

    O rap do Distrito Federal tem sido palco para vozes femininas que transformam realidades e inspiram novas gerações. No Festival Hip Hop no Cerrado, mulheres que moldaram essa cena reafirmaram sua força e legado. O grupo Atitude Feminina, que há 26 anos ocupa espaços no Hip Hop com resistência e autenticidade, teve uma participação marcante. Aninha, uma das idealizadoras do festival, relembra os desafios do início: “Os caras naquela época não queriam a gente”. Mas elas seguiram firmes, construindo um caminho sólido para outras mulheres na música. Helen, também integrante do grupo, resume o impacto de sua trajetória: “Se eu tiver tocado uma mulher, para mim é suficiente”, diz, emocionada.

    Giovana Gomes, Hellen e Aninha (Atitude Feminina)
    Giovana Gomes, Hellen e Aninha (Atitude Feminina)

    Além delas, Cintia Savoy também brilhou no evento, trazendo sua mistura de reggae e rap e reafirmando a potência das mulheres na música urbana. Ex-residente de Ceilândia, Cintia sente a conexão do público com sua arte e valoriza cada troca com quem a escuta. “Sei que Brasília ama o rap, e a Ceilândia é um berço de grandes artistas”, comenta. Com anos de estrada, ela mostra que a música não é apenas entretenimento, mas um instrumento de transformação social. O Festival Hip Hop no Cerrado foi mais uma prova de que o rap do DF segue vivo, forte e, cada vez mais, feminino.

    Um pouco da história e da presença dos artistas de outros estados no palco do festival:

    F-Dois (Porto Velho, Rondônia)

    Diretamente de Porto Velho (RO), o rapper F-Dois celebrou sua participação no 6º Festival de Hip Hop do Cerrado, na Ceilândia, destacando a importância e abrangência do evento, que reúne artistas de todo o Brasil. Ele também esteve presente na 5ª edição e considerou mais uma vez uma experiência única, elogiando a energia do público e a organização do festival. F-Dois ressaltou sua parceria com DJ Raffa Santoro, produtor de todas as suas faixas, incluindo “Quem é Você”, do álbum Pronto para Guerra, disponível no Spotify.

    DJ Monkey

    Diretamente de Florianópolis, DJ Monkey celebrou sua participação no Festival de Hip Hop do Cerrado, na Ceilândia, ao lado do filho, o rapper e produtor VK. Para ele, foi emocionante unir gerações no palco e compartilhar a caminhada com artistas como Japão e DJ Raffa, que foi peça-chave para abrir portas para VK. Monkey destacou os desafios de se fazer Hip Hop em Santa Catarina, estado com cultura eurocentrada e baixa população negra, e exaltou a importância da Ceilândia como referência para o movimento.

    Iniciando sua carreira em 1992, Monkey contou que seu primeiro disco para scratch foi o DJ Scratch, produzido pelo DJ Raffa. Hoje, ele e VK gerenciam um estúdio musical em uma escola de São José (SC), atendendo 120 crianças em contraturno escolar. VK é também o primeiro rapper de sua geração no estado a cursar licenciatura em música pela UDESC. Para Monkey, o Hip Hop vai além da arte: “é ferramenta de transformação social e intergeracional.”

    MC VK (Florianópolis, SC)

    Com 19 anos, VK iniciou sua trajetória no rap aos 12, influenciado pelo pai, DJ Monkey, e pelo convívio desde a infância com estúdios e artistas em Florianópolis. Em sua fala no palco do 6º Festival de Hip Hop do Cerrado, na Ceilândia, destacou os desafios de fazer rap em Santa Catarina, um estado marcado pela cultura eurocentrada e com poucos espaços para a cena negra. Mesmo assim, ressaltou a qualidade e resistência dos artistas locais.

    VK celebrou a oportunidade de dividir palco com nomes como G.O.G., Japão e Atitude Feminina, agradecendo especialmente a DJ Raffa e Japão pelo apoio desde seus 14 anos. Contou também sobre os eventos que fortalece com o pai em Florianópolis, como o tradicional Baile Charme e batalhas de rima. O V de Victor, traz um K, em homenagem ao seu padrinho e pioneiro do Hip Hop em SC, o DJ Kchaça.

    Nova edição do festival confirmada

    A proposta do festival foi clara e poderosa: descentralizar o eixo Rio-SP e valorizar a cultura periférica, mostrando que a arte que nasce nas bordas transforma o centro. E conseguiu. Com maestria.
    A emoção ainda pulsa no meu peito. Vi sorrisos, lágrimas, danças, crianças no ombro dos pais, juventude vibrando, veteranos emocionados. Vi o Hip Hop que me formou e que continua formando tantos. Vi o futuro.

    E a melhor notícia: vem mais por aí. Uma nova edição do festival já está confirmada para o segundo semestre. Porque quando a quebrada se levanta, não tem tempo feio que segure.

  • A impunidade do assassino de Hailé Selassié I

    A impunidade do assassino de Hailé Selassié I

    Mengistu Haile Mariam, o assassino de Hailé Selassié I, vive em exílio no Zimbábue, desafiando a justiça e a memória histórica.

    Cerca de 50 anos após a revolução que derrubou o último imperador da dinastia salomônica, Hailé Selassié I, a justiça ainda parece um sonho distante para os milhares de etíopes que sofreram sob o regime do ditador Mengistu Haile Mariam. Apesar de condenado à morte em 2007 por genocídio e outros crimes contra a humanidade, Mengistu vive exilado no Zimbábue, protegido pelo governo local, deixando um rastro de impunidade que ecoa pelos corredores da história.

    Hailé Selassié I: O “Rei dos Reis” e o Pai do Pan-africanismo

    Hailé Selassié I, que nasceu como Tafari Makonnen em 1892, foi o líder da Etiópia entre 1930 e 1974, incluindo o período da ocupação italiana, de 1936 a 1941. Descendente direto da linhagem do rei Salomão e da rainha de Sabá, Selassié tornou-se uma figura política e espiritual influente tanto dentro quanto fora da África. Durante seu governo, promoveu a modernização do país, introduzindo a primeira universidade, companhias aéreas e hospitais na Etiópia, além de consolidar a posição do país como membro fundador da Organização da Unidade Africana (atual União Africana).
    Mesmo tendo contribuído para o desenvolvimento do país, Hailé Selassié I foi criticado por manter um sistema feudal que alimentava desigualdades. Nos anos 1970, seu governo também ficou marcado por uma fome devastadora, que acabou sendo um dos motivos para sua queda.

    No entanto, para os adeptos do Rastafarianismo — um movimento religioso que emergiu na Jamaica nos anos 1930 — Hailé Selassié I era muito mais que um imperador. Ele era visto como a reencarnação de Jah, uma figura messiânica que libertaria os descendentes africanos da opressão colonial e guiaria um êxodo espiritual e físico para a África. A visita de Selassié à Jamaica em 1966 consolidou seu status entre os rastafáris, sendo saudado por milhares, incluindo a família de Bob Marley, que mais tarde se tornaria um dos maiores divulgadores da causa.

    Estandarte Real Imperial para Haile Selassie I

    Marcus Garvey e o Rei Negro: a profecia que inspirou uma fé global

    O Salmo 87 exalta Sião como a cidade escolhida por Deus, um local de glória onde todas as nações se reúnem em harmonia. Para os rastafáris, esse salmo ecoa a visão profética de Marcus Garvey, que previu o surgimento de um rei negro na África como o salvador dos descendentes africanos no Ocidente. Essa profecia foi vista como cumprida com a coroação de Hailé Selassié I, o “Rei dos Reis” e “Leão Conquistador da Tribo de Judá”. Assim, Sião, simbolizada pela Etiópia, tornou-se um refúgio espiritual, enquanto Selassié foi identificado como a personificação de Jah na Terra, fortalecendo a identidade cultural e a fé dos rastafáris em sua busca por libertação e justiça.

    A ascensão e os crimes de Mengistu Haile Mariam

    Mengistu Haile Mariam, nascido em 1937, foi um dos principais arquitetos do golpe militar que derrubou Hailé Selassié I no ano de 1974. Mengistu, um severo coronel do exército que se tornou um marxista linha-dura, era pouco conhecido do mundo exterior quando liderou um grupo de oficiais do exército na derrubada do imperador.

    Como líder do Derg, a junta militar socialista que assumiu o poder, Mengistu consolidou sua posição por meio de expurgos sangrentos, conhecidos como o “Terror Vermelho”. Entre 1977 e 1978, milhares de oponentes políticos foram torturados e mortos. Estima-se que durante seu regime, dezenas de milhares de pessoas tenham sido assassinadas, além de milhares de desaparecidos cujos destinos permanecem um mistério.

    Entre os crimes mais infames atribuídos a Mengistu Haile Mariam está o assassinato de Hailé Selassié I. Registros históricos apontam que o imperador foi cruelmente estrangulado em seu leito em 1975 e enterrado em uma cova secreta. Anos mais tarde, após a queda do regime do Dergue, quando os restos mortais foram finalmente localizados, constatou-se que quase todos os ossos de seu corpo haviam sido brutalmente quebrados por seus algozes.

    Durante o julgamento de 67 ex-membros da junta militar liderada por Mengistu, os juízes revelaram documentos que descreviam uma reunião realizada em 23 de agosto de 1975, na qual os oficiais decidiram que “Sua Majestade Imperial Hailé Selassié I deveria ser estrangulado por ser o símbolo do sistema feudal”. Em 26 de agosto, o ato foi consumado de maneira cruel em sua própria cama. Este assassinato figura entre os mais de 2.000 homicídios e desaparecimentos supostamente ordenados sob o regime de Mengistu, deixando um legado de horror e impunidade.

    Mengistu manteve-se no poder até 1991, quando foi deposto por grupos rebeldes. Fugiu para o Zimbábue em maio daquele ano, onde recebeu asilo do então presidente Robert Mugabe. Apesar de seu julgamento e condenação à morte por genocídio em 2007, o Zimbábue recusou-se a extraditá-lo, permitindo que vivesse em luxo enquanto suas vítimas continuam a esperar por justiça.

    Mengistu continua impune no Zimbábue

    A memória de Hailé Selassié I e a persistente busca por justiça

    O legado de Hailé Selassié I permanece vivo, tanto na Etiópia quanto na diáspora africana. Em 2000, seu corpo foi reenterrado em uma cerimônia discreta na Catedral da Santíssima Trindade, em Addis Abeba. O evento atraiu lideranças religiosas, monarquistas e rastafáris de todo o mundo, reafirmando seu status como um ícone espiritual e histórico.
    Por outro lado, a sobrevivência de Mengistu Haile Mariam em exílio ilustra as complexidades da justiça internacional. O Zimbábue, sob a liderança de Mugabe, ofereceu-lhe proteção em troca de apoio político e diplomático. Essa situação, para muitos, é um lembrete de como interesses políticos podem obstruir a busca por responsabilização e reconciliação.

    A história de Hailé Selassié I e Mengistu Haile Mariam é um reflexo das contradições da luta por liberdade, poder e justiça na África. Enquanto um representava a continuidade e a resistência contra o colonialismo, o outro simboliza o custo humano de regimes totalitários. A impunidade de Mengistu continua a desafiar os avanços na governança e nos direitos humanos, provando que a justiça é, muitas vezes, uma vitória tardia e incompleta.

    O Imperador na capital brasileira: um encontro de nações

    Imagine a grandiosidade: em 1960, o Imperador Hailé Selassié I, a majestade que personificava a história e a espiritualidade da Etiópia, desembarcou em Brasília. Recebido com honras no aeroporto Juscelino Kubitscheck, acompanhado de todo o seu ministério, o imperador encantou a jovem capital brasileira. No Congresso Nacional e no Superior Tribunal Federal, Selassié foi homenageado como uma figura de grande prestígio internacional. Em uma cerimônia no Palácio do Planalto, condecorou o presidente Juscelino Kubitscheck com a Medalha de Sabá, a mais elevada honraria da Etiópia, simbolizando laços de respeito e cooperação. Durante sua estadia, o Imperador desfrutou da hospitalidade no icônico Palácio da Alvorada, deixando um marco histórico que uniu as duas nações em um momento de celebração e troca cultural.

    Hailé Selassié I e Juscelino Kubitscheck, presidente do Brasil (1960)

    Hailé Selassié I em Brasília (1960)

    Selo comemorativo da visita de Haile Selassie I ao Brasil

    Curiosidades sobre Selassié e Mengistu

    1. A coroação de Hailé Selassié I: Foi um evento grandioso, marcado pelo esplendor e pela presença de líderes e autoridades de diversas partes do mundo. À época, o jornal The New York Times estimou que as festividades custaram mais de US$ 3 milhões (equivalente a cerca de R$ 9,5 milhões em valores atuais). O impacto do evento foi tão significativo que a revista Time dedicou sua capa ao novo imperador, consolidando-o como uma figura de destaque e projeção global.

    2. Fidel Castro e Mengistu: Em 1977, Fidel Castro desembarcou na Etiópia para oferecer apoio ao regime de Mengistu Haile Mariam, marcando o início de uma aliança curiosa. No ano seguinte, Mengistu retribuiu a visita condecorando Castro com a Grande Ordem da Estrela de Honra da Etiópia Socialista. Quando Mengistu chegou a Havana, em 1979, foi recebido com a mais alta honraria de Cuba. A relação continuou em 1984, quando Mengistu voltou a Cuba como convidado especial de Fidel. Durante suas conversas, os líderes focaram nos esforços conjuntos para combater a seca devastadora que assolava vastas regiões da África. O encontro culminou na assinatura de um acordo de cooperação entre os dois países, selando uma aliança marcada por ideais socialistas e momentos de solidariedade internacional.

    3. Bob Marley e o Rastafarismo: Marley considerava Selassié um messias e espalhou sua mensagem em canções como “Jah Live” e “War”, a última baseada em um discurso do imperador na ONU.

    ”Até que os direitos humanos básicos sejam
    igualmente garantidos a todos, sem distinção de raça.
    Isso é uma guerra.”
    (War – Bob Marley)

    Referências:
    A Brief Biography of His Imperial Majesty Emperor Haile Selassie I 23 JULY 1892 – 27 AUGUST 1975
    https://ethiopiancrown.org/biography-emperor-haile-selassie-i/

    Revista Times – 3 de novembro de 1930
    https://time.com/archive/6819639/abyssinia-coronation-2/

    Mengistu Leaves Ethiopia In Shambles
    https://www.washingtonpost.com/archive/politics/1991/05/22/mengistu-leaves-ethiopi a-in-shambles/77631652-4cfb-469a-8af0-d292f1ecc5ec/

    Instituto Cubano del Arte e Industria Cinematográficos
    https://www.youtube.com/watch?v=xey37olc7ZI

    Jornalista especializado no Chifre da África e na África Austral
    https://martinplaut.com/2023/05/23/a-moment-in-history-fidel-castros-visit-to-ethiopia/

    Site do Ministério das Relações Exteriores – República Democrática Federal da Etiópia
    https://www.gov.br/mre/pt-br/assuntos/relacoes-bilaterais/todos-os-paises/republica-democra tica-federal-da-etiopia

    Kapuściński, Ryszard. O Império Africano. Traduzido por Tomasz Barcinski. São Paulo: Companhia das Letras, 1978.

  • GT-RJ representa e fortalece a cultura em Brasília

    GT-RJ representa e fortalece a cultura em Brasília

    Com rimas afiadas e ideias firmes, representantes do Hip Hop carioca mostram que a cultura Hip Hop é a ponte para a transformação social e política

    Nos dias 29 e 30 de novembro de 2024, Brasília respirou rima, ritmo e resistência com o Seminário Internacional da Construção Nacional do Hip Hop. Representando o Rio de Janeiro, oito vozes marcantes do movimento cultural mais revolucionário do planeta levaram suas histórias, perspectivas e desejos para o futuro do Hip Hop. O evento não foi só um marco, mas um grito de união, organizado para construir políticas públicas e fortalecer uma cultura que há 50 anos transforma vidas.

    As vozes do GT-RJ

    De Cabo Frio à Lapa, da CDD à Baixada Fluminense, do basquete de rua às batalhas de rima, os representantes do GT-RJ têm trajetórias que misturam arte, educação e transformação social. Conheça quem são algumas dessas lideranças e o que pensam sobre o impacto do seminário.

    Taz Mureb – MC e porta-voz da resistência do interior

    Primeira colocada no edital do Ministério da Cultura na região Sudeste, Taz Mureb, de Cabo Frio, é MC, produtora cultural e uma das vozes mais marcantes do GT-RJ. Para ela, o seminário é um divisor de águas para a cultura Hip Hop no Brasil.

    “O seminário é um marco. Estamos institucionalizando o Hip Hop como política pública cultural. É mais que música ou dança, é um movimento sociocultural e político. Aqui, a gente abre diálogo com órgãos do governo, empresas e até frentes internacionais. Sonho com o Hip Hop sendo ferramenta de promoção cultural no Brasil e no exterior. É o começo de algo muito maior.”

    Taz destacou também a importância de criar um legado para as próximas gerações: “Precisamos transformar iniciativas locais em políticas nacionais e mostrar que o Hip Hop pode mudar o Brasil. É isso que estamos construindo aqui.”

    DJ Drika – O coração pulsante da Baixada Fluminense

    Adriane Fernandes Freire, ou DJ Drika, carrega a Baixada Fluminense no peito. Fundadora da Roda Cultural do Centenário, ela e sua equipe levam os quatro elementos do Hip Hop para as favelas de Duque de Caxias há seis anos.
    “Estar aqui no seminário é histórico. É uma vitória da cultura periférica, uma chance de dialogar com o governo e fortalecer o que já fazemos nas comunidades. A cultura Hip Hop precisa de apoio contínuo, e eventos como este abrem caminhos para que nossas vozes sejam ouvidas.”

    Drika enfatizou que o Hip Hop não é só arte, mas também resistência: “Nosso movimento nasceu para transformar. Com a parceria do governo federal, podemos ir mais longe e impactar mais vidas.”

    MC Rafinha – A força da união

    Parceiro de Drika na Roda Cultural do Centenário, Rafael Alves, o MC Rafinha, é um mestre de cerimônias que acredita na força coletiva. Ele vê o seminário como uma plataforma para expandir o trabalho que já realiza com batalhas de rima, grafite e poesia na Baixada Fluminense.

    “Esse evento é sobre união. É a chance de estarmos juntos, trocando ideias e mostrando que o Hip Hop vai além das nossas rodas culturais. Aqui, colocamos nossa luta no mapa e mostramos que estamos prontos para construir juntos.”

    Para Rafinha, o seminário marca o início de um novo capítulo para o movimento. “O Hip Hop é a voz da periferia. Estar aqui é garantir que essa voz ecoe mais alto.”

    Erick CK – Conectando a cena em Niterói

    Com sete anos de atuação nas rodas culturais de Niterói, Erick Silva, o CK, sabe o peso de levar o Hip Hop para os palcos e ruas. No seminário, ele viu uma oportunidade de conectar as demandas dos artistas locais com políticas públicas mais amplas.

    “É muito importante estarmos aqui. Precisamos discutir os problemas reais do Hip Hop, como falta de patrocínio para DJs e grafiteiros, e a valorização dos produtores que estão sempre nos bastidores. O seminário abre essas portas.”

    CK ressaltou a relevância de manter o diálogo aberto para futuras edições: “Que este seja o primeiro de muitos eventos que fortaleçam o movimento em todo o Brasil.”

    Anderson Reef – Transformação social em Madureira

    Palestrante no painel “Retratos do Brasil: Narrativas Regionais e Potência Construtiva”, Reef é produtor cultural, responsável pela Batalha Marginow, evento semanal, que acontece todas as segundas e tem uma década de trabalho embaixo do Viaduto Madureira, zona norte do Rio. Ele usa o Hip Hop para revitalizar espaços e gerar economia criativa.

    “O Hip Hop salva vidas. Aqui em Brasília, mostramos ao governo que nosso movimento vai além da música. Trabalhamos com saúde, educação, teatro e dança. Precisamos de mais estrutura para continuar impactando nossas comunidades.”

    Para Reef, o seminário também é um espaço para pensar grande: “Quero ver o próximo evento num lugar maior, com mais gente. O Hip Hop merece ser tratado como prioridade nacional.”

    Anderson Reef

    Rafa Guze – Uma cineasta na linha de frente

    Educadora social e diretora do Instituto BR-55, Rafa Guze acredita no poder do Hip Hop para transformar vulnerabilidades sociais. Para ela, o seminário é uma chance de estruturar
    políticas que atendam as bases do movimento.

    “O Hip Hop é uma potência global, mas nossas comunidades ainda enfrentam muitas dificuldades. Este evento é sobre construir soluções, criar políticas que combatam fome, genocídio, feminicídio e outras desigualdades. É sobre usar nossa cultura para transformar realidades.”

    Rafa destacou a importância de trabalhar em parceria com o governo: “Sabemos como resolver os problemas. Só precisamos de apoio para fazer isso acontecer.”

    Lebron – Formando novas gerações

    Victor, ou Lebron, é um veterano do basquete de rua e do Hip Hop em Campos dos Goytacazes. Fundador de uma ONG que atua há 18 anos, ele vê o seminário como uma oportunidade de renovar o movimento.

    “O Hip Hop me ensinou tudo que sei. Agora, quero retribuir, formando novas gerações de artistas, DJs e produtores culturais. Precisamos de mais eventos assim, que conectem pessoas e ideias para planejar o futuro.”

    Para Lebron, o maior desafio é garantir que o movimento continue crescendo de forma sustentável: “Estamos retomando espaços e precisamos de articulação para avançar.”

    Bruno Rafael

    Bruno Rafael – Liderança que inspira

    Com 27 anos de trajetória, Bruno Rafael é uma figura central do Hip Hop carioca. Palestrante no painel “Retratos do Brasil: Narrativas Regionais e Potência Construtiva”, ele destacou o amadurecimento do movimento.

    “Esse seminário é fruto de trabalho coletivo. Mostramos que o Hip Hop está politizado e organizado. Hoje, conseguimos dialogar diretamente com ministros e secretários, algo que
    nunca foi possível antes.”

    Para Bruno, o evento é um reflexo da força do movimento: “O Hip Hop tem o poder de transformar vidas. Estamos só começando a mostrar do que somos capazes.”

    O impacto do seminário

    Entre as falas, há um consenso: o Hip Hop precisa ser reconhecido como política pública prioritária. Os representantes do GT-RJ destacaram que o movimento não é apenas arte, mas uma ferramenta para combater desigualdades, gerar renda e formar futuros líderes culturais. Para os representantes do GT-RJ, dois nomes de peso tiveram grande importância para a realização deste seminário: Claudia Maciel e Rafa Rafuagi.

    “A Claudia é pura visão estratégica”, disse Taz Mureb.

    Já Rafa Rafuagi, é a ponte que liga cultura e política: “Ele é aquele cara que transforma discurso em ação. Além de ser referência no rap do Sul, ele trouxe a ideia de que o Hip Hop pode e deve dialogar diretamente com o governo, sem perder nossa essência de resistência.”

    Para o grupo, Cláudia e Rafa não foram apenas organizadores, mas exemplos vivos de que o Hip Hop é articulação, união e transformação.

    Caminhos para o futuro

    O Seminário Internacional da Construção Nacional do Hip Hop foi mais do que um evento. Foi um passo firme em direção a um Brasil mais justo e diverso, onde a cultura Hip Hop ocupa o lugar que merece: o de protagonista na transformação social.

    Com vozes como as do GT-RJ, o futuro do Hip Hop promete ser brilhante – e revolucionário.

    No corre da favela e do asfalto, na batida da vida, todo mundo mandou o papo reto: “O Hip Hop salva vidas!”

  • Hip-Hop em Movimento: Transformação social e sustentabilidade na periferia e além

    Hip-Hop em Movimento: Transformação social e sustentabilidade na periferia e além

    No 1º dia do Seminário Internacional do Hip-Hop, artistas e ativistas mostram como o movimento une cultura, economia criativa e impacto social.

    O auditório da Petrobras em Brasília foi palco de um dos momentos mais significativos para a cultura Hip-Hop no Brasil nesta sexta-feira (29/11). Dentro do 1º Seminário Internacional do Hip-Hop, que se estende até sábado (30), o painel “Inovação e Sustentabilidade na Cultura Hip-Hop como Economia Criativa” reuniu artistas, pesquisadores e gestores culturais de diferentes partes do Brasil e da América Latina. Com o objetivo de discutir caminhos para fortalecer o movimento enquanto ferramenta de transformação social e fonte de renda, a conversa trouxe reflexões sobre políticas públicas, iniciativas locais e o papel do
    Hip-Hop como patrimônio cultural.

    Sustentabilidade e inovação no Hip-Hop: depoimentos que inspiram

    O painel contou com a participação de nomes expressivos, como CDJ de Goiás, Giovanni Nieto, conhecido como YBNT da Colômbia, Douglas Nunes da Secretaria de Relações Institucionais da Presidência da República, a produtora cultural Andrea Felix de Uberlândia, Minas Gerais e Jailson Correia, o Preto Mil Grau de Guiné Bissau. Cada um deles trouxe experiências de como o Hip-Hop vem rompendo barreiras e construindo novas possibilidades.

    Para o hip hoper CDJ, o Hip-Hop não é apenas um movimento cultural, mas uma ferramenta econômica e social transformadora. “Participar dessa rodada de conversa foi algo muito importante para que a gente pudesse transmitir um pouco do que eu acredito ser sustentabilidade. É buscar meios de capacitar a galera, principalmente nas periferias, para que elas possam olhar para o Hip-Hop como fonte de renda através da música, dança, grafite e discotecagem”, destacou.

    Ele também apontou ações concretas em Goiás, como plantio de árvores e hortas comunitárias, que geram não apenas renda, mas também segurança alimentar nas periferias. “O Hip-Hop pode dialogar com a iniciativa privada e o poder público, porque ele traz retorno. Diversas empresas querem seu nome ligado a algo sustentável, e acredito que o Hip-Hop é essa fonte.”

    Da Colômbia, YBNT, idealizador do festival ambiental Cuida Natura, compartilhou como o movimento se consolidou em parceria com instituições públicas. “Na Colômbia, conseguimos aliar o Hip-Hop à universidade pública, formando artistas e docentes capazes de ensinar Hip-Hop em escolas, universidades, fundações, e até mesmo em presídios. Nosso trabalho inclui populações indígenas, afrodescendentes e moradores de rua, sempre com um enfoque pedagógico e de paz nos territórios.”

    Negro Lamar (Maranhão), DJ Fábio ACM e DJ Big

    O papel das políticas públicas e do Conselhão

    Representando a Secretaria de Relações Institucionais da Presidência da República, Douglas Nunes destacou a importância do diálogo com o movimento para a construção de políticas públicas mais eficazes. Ele ressaltou a atuação de Cláudia Maciel, conselheira do presidente Lula e uma das articuladoras do seminário, no debate sobre igualdade racial.

    “Ela levou ao Conselhão o compromisso de transformar as demandas e propostas geradas aqui em políticas públicas concretas, reforçando a escuta ativa das comunidades.”

    Hip-Hop em rede: conexões nacionais e internacionais

    Para Andrea Felix, organizadora do UDI Hip-Hop Festival, o impacto do Hip-Hop transcende fronteiras. Ela compartilhou a experiência de Uberlândia, onde o festival se consolidou como o maior do Triângulo Mineiro, fomentando economia criativa e inspirando eventos semelhantes em Salvador, Portugal e Emirados Árabes. “Essa troca fortalece nossa construção nacional e expande nosso alcance. A 14ª edição do festival já conta com apoio da prefeitura pelo terceiro ano consecutivo, mostrando como é possível fazer o Hip-Hop gerar economia e transformação.”

    Já Jailson Correia, o Preto Mil Grau de Guiné Bissau, reforçou a essência educativa do movimento. “Um evento como esse traz um dos pilares do Hip-Hop, que é o conhecimento. Esse espaço é fundamental para a troca de saberes e a mistura de culturas, que só fortalecem o movimento.”

    Contexto e avanços do Seminário Internacional

    O seminário, que ocorre dentro do calendário da Campanha Cultura Negra Vive, celebra o Dia Mundial do Hip-Hop (12/11) e o Mês da Consciência Negra (20/11). A programação diversificada inclui mesas-redondas como “Cultura Hip-Hop como Patrimônio Imaterial”, debates sobre igualdade racial e apresentações culturais de grupos como Atitude Feminina e Viela 17.

    Segundo Cláudia Maciel, o evento marca um momento histórico para o movimento. “O decreto nº 11.784, assinado pelo presidente Lula, consolida o Hip-Hop como uma legítima expressão da identidade brasileira. Além disso, o inventário participativo com o Iphan avança no reconhecimento do Hip-Hop como Patrimônio Cultural Imaterial.”

    A ministra da Cultura, Margareth Menezes, e a socióloga Vilma Reis também estão entre os grandes nomes que compõem as discussões. O evento reflete o fortalecimento do movimento como força cultural e política no Brasil e no mundo, apontando para um futuro onde o Hip-Hop se consolida como eixo transformador da sociedade.

    Protagonismo das comunidades periféricas

    Os debates também destacam o papel das comunidades periféricas como epicentro do Hip-Hop. A conexão entre tradição e inovação surge como um dos principais motores para transformar realidades e ampliar a luta por justiça social e racial.

    No segundo dia do seminário, o foco será a implementação de políticas públicas específicas para o movimento, com mesas como “Mulherismo Afrikana e Políticas Públicas para
    Homens Negros” e “Cultura de Base Comunitária como Ferramenta de Transformação Social”.

    O encerramento ficará por conta do grupo Viela 17, consolidando o Hip-Hop como uma força vibrante e necessária para a cultura brasileira.

  • Em memória e renovação, Vanessa Campos lança canção “Folha Seca” com voz de Felipe Silva Zion

    Em memória e renovação, Vanessa Campos lança canção “Folha Seca” com voz de Felipe Silva Zion

    Single póstumo de Felipe Silva Zion ganha vida com inteligência artificial e produção colaborativa, destacando a conexão profunda entre ciclos da natureza e o legado do reggae

    A cantora brasiliense Vanessa Campos, inspirada por influências do reggae e MPB, acaba de lançar seu segundo single, “Folha Seca”, uma canção inédita criada em parceria com Felipe Silva Zion, ícone do reggae brasileiro, falecido em 2019. Com produção musical de Miguel Bittencourt, e direção do DJ Fábio ACM, a música utilizou inteligência artificial para isolar e tratar a voz de Felipe, proporcionando uma conexão póstuma que amplia o legado do cantor.

    Assista ao videoclipe "Reflexões que ainda me tiram o sono".

    Para Vanessa, que tem uma forte ligação com a cena musical de Brasília e integrou o grupo cultural Batalá, “Folha Seca” se tornou uma experiência profunda desde o primeiro contato. Ela conta que recebeu uma versão inicial da música em voz e violão pelos DJs Fábio ACM e Lázaro Peloggio, grandes amigos de Felipe Silva. “Recebi uma versão de ‘Folha Seca’ em voz e violão através dos DJs Fábio ACM e Lázaro Peloggio, grandes amigos do Felipe Silva. Desde a primeira vez que ouvi, a música ficou comigo. Eu cantava ‘Folha Seca’ o tempo todo — em casa, dirigindo… Foi então que o Fábio sugeriu lançá-la oficialmente. Nunca tive a chance de conhecer o Felipe, mas toda a sua obra, desde os tempos do Monte Zion, me encanta e está sempre nas minhas playlists. ‘Folha Seca’ traz uma mensagem
    profunda sobre os ciclos da vida e o poder da renovação.”

    O papel da inteligência artificial

    Inspirados pelo recente lançamento dos Beatles, “Now and Then”, que utilizou inteligência artificial para resgatar a voz de John Lennon, a equipe de produção decidiu aplicar a mesma tecnologia para recuperar e tratar a voz de Felipe Silva Zion. O resultado traz uma autenticidade que emociona os fãs e permite que a essência de Felipe seja sentida em cada nota. DJ Fábio ACM compartilhou sobre o processo: “Assim como os Beatles fizeram, usamos técnicas de inteligência artificial para isolar e tratar a voz do Felipe. Decidi confiar a produção musical ao Miguel Bittencourt, que foi produtor do Felipe na época de sua morte, com a certeza de que ele entregaria um resultado fiel ao que Felipe desejaria. Miguel integrou a voz do Felipe de forma brilhante nos novos arranjos, e o resultado ficou incrível. Também convidamos Bruno Ras para gravar guitarras, teclados e back-vocais. Bruno foi membro da banda Monte Zion, fundada por Felipe e André Jamaica no final dos anos 90, no Rio de Janeiro.”

    Folha Seca: uma poesia sobre os ciclos da vida

    “Folha Seca” é uma canção introspectiva que aborda temas como renovação e transformação. A composição de Felipe utiliza a metáfora da natureza para simbolizar os ciclos de vida e mudança. No refrão, “Vento leva a folha seca / Ele sopra e ela vai”, a folha seca simboliza aquilo que é deixado para trás, enquanto o vento, com sua força transformadora, carrega consigo a promessa de novos começos. A letra ressalta que, embora a folha seca represente o final de um ciclo, o vento também leva a semente, que será plantada em outro lugar, simbolizando acontinuidade e o potencial de renascimento.

    A primeira estrofe, que fala sobre a folha verde ainda firme em seu galho, representa resistência e vitalidade. A folha verde oferece sombra e cura, uma figura de proteção e conexão entre humanos e natureza. Esse ciclo de renovação é intensificado pelo verso “Viva a fotossíntese, eu te dou ar”, reforçando a importância vital da natureza.

    Na segunda parte da letra, o vento ganha um papel ativo e dinâmico: ele move as árvores, traz a chuva e renova a paisagem, simbolizando a força de transformação e equilíbrio na natureza. O tom final da canção se ilumina com uma nota de celebração à vida, falando de um novo ciclo de felicidade com o nascimento de uma criança. Vanessa comenta que “Folha Seca” transmite uma mensagem positiva sobre o poder dos ciclos e da renovação, convidando o ouvinte a refletir sobre o equilíbrio da natureza e as lições que podemos tirar dela.

    Produção musical e sonoridade

    A produção de “Folha Seca” é marcada pela presença do reggae, estilo que sempre acompanhou tanto Felipe Silva quanto Vanessa Campos. O produtor Miguel Bittencourt, que colaborou com Felipe em vida, conseguiu dar à canção uma base harmônica rica e envolvente, preservando a essência do reggae raiz e explorando arranjos contemplativos. Além disso, Bruno Ras, antigo integrante da banda Monte Zion, adiciona camadas instrumentais com guitarras, teclados e back-vocais que enriquecem a atmosfera poética da música. A direção musical de DJ Fábio ACM, combinada com a experiência de Bittencourt, cria uma estética sonora única que complementa a letra profundamente simbólica de Felipe.

    DJ Fabio ACM, Felipe SIlva Zion e Lazaro Peloggio

    O legado de Felipe Silva Zion

    Nascido na Rocinha, no Rio de Janeiro, Felipe Silva Zion foi um dos grandes nomes do reggae brasileiro, admirado por sua conexão espiritual com a música e pelo impacto social de suas letras. Inspirado por Bob Marley e pela filosofia Rastafari, Felipe via o reggae como uma ferramenta de conscientização e transformação. Ele colaborou com artistas de renome internacional, como Pato Banton e Andrew Tosh, e foi o fundador da banda Monte Zion, junto a André Jamaica, nos anos 90.

    A morte de Felipe, em 2019, foi um choque para a cena reggae, mas seu legado continua vivo graças a suas gravações e ao trabalho dedicado de seus amigos e familiares. Bittencourt, que preserva o acervo musical do cantor, garante que as futuras gerações, incluindo o filho de Felipe, Inti, possam usufruir desse tesouro artístico.

    Disponível nas plataformas digitais

    O single “Folha Seca” já está disponível nas principais plataformas de streaming. Vanessa Campos e a equipe de produção esperam que a canção, com sua mensagem atemporal e profundamente humana, toque os corações dos ouvintes e leve adiante o legado de Felipe Silva Zion. Para aqueles que desejam explorar mais o trabalho de Vanessa e revisitar a obra de Felipe, “Folha Seca” é uma oportunidade única de ouvir uma colaboração inédita que conecta a sensibilidade dos dois artistas.

    Escute “Folha Seca” nas plataformas digitais:

    ● Spotify:
    https://open.spotify.com/intl-pt/album/5bzjnpwZgmtLclUjEannww
    ● You Tube:
    https://www.youtube.com/watch?v=UECNlJLXLWE
    ● Deezer:
    https://www.deezer.com/br/album/654889931
    ● Apple Music:
    https://music.apple.com/br/album/folha-seca-single/1773305138
    ● Amazon Music:
    https://music.amazon.com/tracks/B0DJTG22CR?marketplaceId=ART4WZ8MWBX2Y&musicTerritory=BR&ref=dm_sh_iiZwOPuIT5mmztT7U56k7ms3F

    “Folha Seca” é um presente ao reggae e uma homenagem a Felipe Silva Zion, trazendo à tona sua essência artística e sua visão sobre vida, natureza e renovação, em uma jornada musical que resgata o passado e celebra a continuidade.

  • A Filosofia do Scratch: DJ Qbert e o futuro do turntablism

    A Filosofia do Scratch: DJ Qbert e o futuro do turntablism

    A lenda e sua jornada infinita nos rabiscos

    Nascido em 7 de outubro de 1969, Richard Quitevis, mais conhecido pelo nome artístico DJ Qbert, é uma lenda viva no mundo do DJing. De origem filipino-americana, Qbert é amplamente reconhecido como um dos maiores turntablists de todos os tempos, influenciando profundamente a história do DJing. Seu impacto é tão notável que ele foi nomeado o Melhor DJ dos EUA (America’s Best DJ) em 2010, através de votação popular, e venceu competições de prestígio, como o DMC USA Champion em 1991 e os títulos de Campeão Mundial do DMC em 1992 e 1993. Qbert também foi um dos membros fundadores do Invisible Skratch Piklz, um dos primeiros grupos a aplicar o conceito de banda ao turntablism, criando camadas de sons com scratch, linhas de baixo e solos sobrepostos.

    Em 1990, Qbert começou sua carreira musical no grupo FM20, com Mix Master Mike e DJ Apollo. Esse grupo logo chamou a atenção de Crazy Legs, que os convidou para se juntarem ao lendário Rock Steady Crew*. O trio, atuando como Rock Steady DJs, venceu o Disco Mix Club World DJ Championships (DMC) de 1992, solidificando sua posição na elite do DJing mundial. Ao longo de sua carreira, Qbert tem sido um líder na inovação do turntablism e um educador dedicado. Em maio de 2009, ele lançou a Qbert Skratch University (QSU), uma escola de aprendizado online que proporciona uma plataforma interativa para DJs de todo o mundo, promovendo uma comunidade vibrante de artistas do scratch.
    Em abril de 2013, durante um debate ao vivo na Skratch University, Qbert compartilhou seus pensamentos sobre a evolução do DJing, a importância da teoria do scratch e como ele encara sua jornada como um eterno estudante da arte.

    A Teoria do Scratch: explorando as profundezas do DJing

    Mesmo com sua vasta experiência e seus muitos títulos, DJ Qbert se define como um eterno estudante. “Deixe-me começar dizendo que também sou estudante. Ainda estou aprendendo coisas e realmente… Estou apenas arranhando a superfície — desculpe o trocadilho — de aprender sobre a teoria do scratch”, disse ele logo no início da discussão.
    Essa humildade e desejo constante de aprendizado são características que definem não só sua carreira, mas também sua abordagem ao ensino por meio da QSU.
    A Teoria do Scratch, segundo Qbert, vai muito além das técnicas básicas. Trata-se de uma filosofia que abrange a manipulação criativa do som e a expressão de emoções por meio do scratching. Para ele, o DJing é comparável à arte visual, onde conceitos como volume, profundidade e eco podem ser traduzidos em formas tridimensionais de som. Qbert
    menciona que Justin Bua, artista visual, que o ajudou a entender essa conexão. “Bua realmente me ensinou muitas coisas sobre pintura e arte e como isso se aplica à teoria do scratch. Ele estava falando sobre profundidade e coisas assim, e como isso é tridimensional. Eu meio que traduzi isso para o volume, você sabe, como ecoar os scratches e coisas assim.”

    Essa abordagem que mistura arte visual e DJing reflete o desejo de Qbert de expandir as fronteiras do que o scratching pode ser. Ele vê o DJing como uma forma de arte que transcende suas raízes no hip hop, uma evolução que está apenas começando. “A teoria do scratch é sobre sair do básico e começar a criar com esse novo vocabulário”, afirmou.

    Legenda: DJ Qbert byJustin BUA

    De técnicas básicas a uma nova linguagem

    Nos anos 1980, quando o scratching começou a surgir na cultura hip hop, ele era amplamente visto como uma técnica rudimentar, usada para adicionar efeitos sonoros às batidas. Hoje, Qbert vê o scratching como uma linguagem completa, que pode ser usada para expressar ideias complexas e emoções profundas. Ele explicou que, à medida que a prática do scratching evoluiu, as técnicas básicas deram lugar a uma verdadeira gramática musical, permitindo que os DJs construíssem frases e contassem histórias por meio do som.
    “Agora que sabemos como fazer scratches, a questão é por quê. A teoria do scratch é sobre sair do básico e começar a criar com esse novo vocabulário”, disse ele. Para Qbert, o scratching se tornou um idioma em que o DJ pode “conversar” com o público, criando uma narrativa sonora que vai além das batidas e dos efeitos. Essa evolução técnica é um reflexo direto do que Qbert chama de “gramática do scratch”, onde a compreensão de como os sons se entrelaçam e se sobrepõem se torna a chave para um desempenho mais dinâmico. “Começamos com scratches simples, depois as pessoas começaram a usar o crossfader, depois vieram as técnicas de flaring, o uso do vinil em velocidades diferentes, e então tudo se tornou mais sobre teoria musical, com a cor, a
    textura, as emoções, o lado espiritual”, afirmou.

    O elemento espiritual no scratching

    Um dos aspectos mais fascinantes da abordagem de DJ Qbert ao DJing é a importância que ele dá ao elemento espiritual. Para ele, o scratching não é apenas uma atividade técnica, mas também uma forma de meditação. “Às vezes, eu faço esses exercícios de meditação e, depois de cerca de 20 minutos, entro em um estado onde tudo parece se encaixar. Isso acontece com o scratching também, onde você atinge um estado de foco profundo, onde tudo flui naturalmente”, explicou.
    Qbert comparou esse estado de fluxo a um fenômeno que alguns atletas de elite experimentam, onde os movimentos parecem desacelerar, permitindo uma percepção mais clara do que está acontecendo ao redor. Ele mencionou que, durante sessões de scratching, frequentemente atinge um ponto onde suas mãos estão operando no presente, enquanto sua mente está alguns segundos à frente, antecipando os próximos movimentos.

    “Quando você entra nessa zona, seus scratches ficam assim, onde você já está pensando no próximo movimento enquanto suas mãos e o som estão no presente”, disse ele.
    Essa descrição revela a profundidade com que Qbert encara sua prática, onde o scratching se torna quase uma extensão de sua própria mente e corpo, um meio de expressão onde o
    tempo e o espaço parecem se dissolver.

    O silêncio como parte da música

    Durante a discussão, Qbert também abordou a importância do silêncio na música e no DJing. Ele destacou como as pausas e os espaços vazios podem ser usados para criar tensão e dar mais impacto ao som. “O silêncio é tão importante no scratching quanto o som em si. As pausas criam tensão, assim como na poesia ou na arte, onde o espaço negativo
    adiciona significado”, observou.
    Essa ideia de usar o silêncio como parte integral da música está em sintonia com o conceito de minimalismo em várias formas de arte, onde o que não é dito ou mostrado é tão importante quanto o que é exposto. Para Qbert, os momentos de pausa no scratching são oportunidades para o DJ criar uma expectativa no público, tornando o retorno do som ainda
    mais poderoso.

    A transição do vinil para o digital

    Embora DJ Qbert tenha começado sua carreira trabalhando exclusivamente com vinil, ele reconhece as vantagens e desafios que as tecnologias digitais trouxeram para o DJing.
    Durante a discussão, ele refletiu sobre as diferenças entre o scratching feito com vinil tradicional e o uso de sistemas digitais, como o Traktor.
    “Quando se trata de digital vs. vinil, há uma pequena diferença na sensação, especialmente para scratches mais complexos. O vinil me dá mais controle para certas técnicas, mas o
    digital é conveniente para performances ao vivo”, explicou Qbert.
    Ele mencionou que, embora o vinil ainda ofereça uma sensação única para técnicas mais avançadas, os sistemas digitais permitem que os DJs realizem performances com uma flexibilidade que seria impossível de outra forma. A capacidade de misturar faixas de diferentes fontes e manipular sons digitais em tempo real tem permitido que Qbert e outros
    DJs explorem novos territórios criativos.
    Essa flexibilidade em usar diferentes tecnologias mostra que, para Qbert, o importante não é a ferramenta em si, mas a forma como ela pode ser usada para aprimorar a expressão
    artística.

    DJ QBERT tocando AO VIVO

    A jornada contínua de Qbert

    DJ Qbert continua a ser uma força inovadora no mundo do turntablism, e sua dedicação ao ensino e à expansão das fronteiras da arte do scratching é evidente. Para ele, o DJing não é apenas sobre técnica ou performance, mas sobre criar uma conexão profunda com a música, com o público e com algo maior. Em suas próprias palavras: “Ainda estou aprendendo, e essa jornada nunca vai acabar.”
    Com uma carreira que já atravessa décadas, DJ Qbert permanece como uma inspiração para DJs em todo o mundo, mostrando que, independentemente do nível de habilidade ou
    reconhecimento, sempre há algo novo a descobrir e a explorar na arte do scratching.
    QBert centraliza suas atividades no site oficial www.djqbert.com. A plataforma oferece uma variedade de produtos como discos de vinil, roupas, equipamentos para DJs, além de
    downloads de músicas exclusivas. Também abriga a marca Dirtstyle Records, fundada pelo próprio QBert, com lançamentos e acessórios para DJs. O site é voltado tanto para fãs da
    cultura DJ quanto para profissionais, incluindo assinaturas que oferecem descontos e acesso a edições limitadas de seus produtos.

    DJ Q-Bert – Wave Twisters. Um filme de 2001.

    Notas:
    1- O Turntablism é a arte de manipular sons e criar músicas usando o toca-discos e mixer. A palavra turntablist foi criada para descrever a diferença entre um DJ, que apenas reproduz discos, de um DJ que manipula e mistura as músicas para criar um novo som.
    2- O Rock Steady Crew (RSC) foi uma equipe de breakdance criada em 1979, no Bronx, Nova Iorque.
    3- Crazy Legs é um b-boy americano, undador da Rock Steady Crew, e foi destaque nas primeiras histórias sobre breakdance que apareceram na grande imprensa.
    4- Justin Bua é um artista conhecido por suas pinturas narrativas líricas de músicos, DJs e personagens. Bua projetou e ilustrou uma infinidade de produtos que que incluem skates, capas de álbuns de CD, vestuário e campanhas publicitárias.

  • De Kingston para o mundo: a trajetória do Studio One e o nascimento do reggae 

    De Kingston para o mundo: a trajetória do Studio One e o nascimento do reggae 

    Como o Studio One, sob a liderança de Clement “Coxsone” Dodd, moldou o panorama musical da Jamaica, transformando uma ilha recém-independente na capital mundial do reggae.

    O surgimento de uma nação e o despertar cultural

    No início dos anos 1950, Jamaica ainda era uma colônia britânica, conhecida principalmente por suas plantações de açúcar e seu papel no comércio do Caribe. Após a Segunda Guerra Mundial, a ilha começou a atrair turistas de elite, com sua exuberante costa e hotéis de luxo como Round Hill e Tower Isle. As praias paradisíacas de Montego Bay e Ocho Rios transformaram a ilha em um refúgio tropical desejado.

    No entanto, ao mesmo tempo que o turismo prosperava, Kingston, a capital da ilha, fervilhava com a energia criativa que logo mudaria o cenário cultural global. Em 6 de agosto de 1962, a Jamaica conquistou sua independência do Reino Unido. A celebração foi marcada pela visita da Princesa Margaret, representando a Rainha Elizabeth, e pelo entusiasmo de uma população ansiosa por definir seu destino.

    Sir William Bustamante, o primeiro-ministro, liderou o país em uma nova era de autogoverno. Com uma economia relativamente estável, a Jamaica se preparava para enfrentar os desafios e
    oportunidades que a independência traria.

    No entanto, a verdadeira revolução jamaicana não foi apenas política – foi cultural. Nas ruas de Kingston, uma geração de jovens começava a moldar uma identidade musical única que,
    em poucas décadas, dominaria o mundo.

    A verdadeira revolução jamaicana não foi apenas política – foi cultural.

    O cenário musical em transformação

    Nos anos 1950, o gosto musical da Jamaica estava em transição. A música tradicional, como o mento e o calipso, não conquistava o público local. Em vez disso, os jamaicanos eram atraídos pelo som vibrante do R&B e do boogie-woogie norte-americano, com artistas como Louis Jordan e Fats Domino dominando as pistas de dança. As grandes festas de Kingston, conhecidas como sound systems, eram o centro da vida noturna, e foi nesse ambiente que surgiu um dos maiores pioneiros da música jamaicana: Clement “Coxsone” Dodd (☆1932 ✞ 2004).

    Coxsone, como era amplamente conhecido, nasceu em Kingston e sempre teve uma paixão pela música. No início de sua carreira, ele importava discos de R&B e jazz dos Estados Unidos e os tocava em festas organizadas por sua equipe de som, Downbeat Sound System. “Naquela época, o que fazia sucesso nas pistas de dança de Kingston era o boogie-woogie e o R&B americano”, disse Dodd em uma entrevista de 1975.

    “As pessoas queriam ouvir aquela batida pulsante, e eu sabia exatamente quais discos trariam a multidão para o salão”. Mas Coxsone não estava satisfeito em ser apenas um DJ. Ele tinha uma visão maior: criar música jamaicana original que refletisse o espírito da ilha. Nos anos 1950, ele começou a experimentar gravar suas próprias produções, recrutando músicos locais talentosos e lançando discos sob seu próprio selo. Foi assim que nasceu o Studio One, o estúdio que se tornaria o epicentro da música jamaicana.

    Studio One: a fábrica de estrelas

    Fundado em 1954, o Studio One começou modestamente, mas logo se tornou uma verdadeira instituição cultural. Clement Dodd tinha um talento único para descobrir e
    desenvolver artistas. Sob sua orientação, muitos dos maiores nomes do reggae começaram suas carreiras no Studio One, incluindo Bob Marley e The Wailers, Dennis Brown, Alton
    Ellis, Burning Spear e Toots and the Maytals.

    “Quando entrei pela primeira vez no Studio One, era só um jovem com grandes sonhos”, lembra Bob Marley em uma entrevista de 1978. “Coxsone me deu a chance de mostrar meu talento. Ele não era só um produtor, ele era um mentor. Eu e os Wailers aprendemos tudo lá dentro – desde como construir uma música até como tocar para as massas”.

    Dodd também acreditava na importância de criar uma identidade sonora jamaicana. No início, ele e seus músicos misturavam o R&B americano com elementos de música tradicional da ilha. Esse processo experimental levou ao desenvolvimento do ska, o precursor direto do reggae. “Foi uma evolução natural”, disse Dodd. “Nós queríamos algo com uma batida própria, algo que as pessoas pudessem chamar de jamaicano. E foi assim que o ska nasceu”.

    O Studio One funcionava como uma escola de música. Dodd reunia uma equipe talentosa de músicos, como o saxofonista Roland Alphonso e o trombonista Don Drummond, que formaram a banda The Skatalites, uma das mais importantes da história do ska. Com sua liderança, o Studio One produziu uma sequência de sucessos que moldariam o som da Jamaica para sempre.

    A era do Ska e a chegada do Reggae

    Nos anos 1960, o ska dominava as pistas de dança da Jamaica. O ritmo acelerado, com seus metais vibrantes e batida marcada, refletia o clima de otimismo e agitação que
    permeava a sociedade jamaicana após a independência. As festas promovidas pelos sound systems de Coxsone eram lendárias. As canções gravadas no Studio One, como “Simmer
    Down” dos Wailers e “Carry Go Bring Come” de Justin Hinds, tornaram-se hinos de umanova geração.

    No entanto, à medida que a década avançava, o clima na Jamaica começou a mudar. A tensão social e política levou a uma desaceleração no ritmo da música. O ska deu lugar ao
    rocksteady, um estilo mais lento e introspectivo, que refletia o crescente descontentamento nas ruas. “O rocksteady veio do ska”, explicou Dodd. “Nós começamos a diminuir o tempo
    das músicas, colocar mais ênfase nas letras e nas harmonias”.

    Essa evolução abriu caminho para o surgimento do reggae no final dos anos 60. O reggae, com sua batida sincopada e mensagem de resistência e espiritualidade, tornou-se a voz de
    uma Jamaica em transformação. E mais uma vez, o Studio One estava na vanguarda dessa revolução.

    LINK:

    O impacto global do Reggae

    Nos anos 1970, o reggae explodiu no cenário internacional, em grande parte graças a artistas como Bob Marley, que levaram o som da Jamaica a audiências globais. O Studio One continuou a desempenhar um papel central na produção de novos talentos e na inovação sonora. Dodd, sempre à frente de seu tempo, começou a experimentar com o dub, uma técnica de remixagem que adicionava efeitos como eco e reverb às faixas de reggae, criando uma nova dimensão musical.

    “Quando começamos a brincar com o dub, foi uma revolução”, disse Dodd em uma entrevista. “O som ficou mais profundo, mais envolvente. Era como se a música tivesse
    ganhado outra vida”. Além disso, o Studio One influenciou diretamente a cultura dos sound systems. Esses sistemas de som móveis, operados por DJs e selectors, tornaram-se o centro da cultura
    musical jamaicana, levando o reggae e o dub a cada canto da ilha e, eventualmente, para o exterior. Dodd, com sua experiência em festas de som, sabia exatamente como moldar a música para que ela ressoasse com o público.

    As lendas do Studio One

    Ao longo dos anos, o Studio One lançou uma quantidade impressionante de músicas que se tornaram clássicos. Clement Dodd não apenas produziu grandes sucessos, mas também criou uma atmosfera onde os artistas podiam experimentar e desenvolver suas habilidades. “Coxsone sempre me dizia: ‘Você tem que sentir a música, deixar ela te guiar’“, disse Dennis Brown, um dos maiores nomes do reggae, em uma entrevista de 1981.

    Ele nos dava liberdade para criar, mas também sabia como nos direcionar”. O Studio One era mais do que um estúdio de gravação – era um espaço de colaboração e aprendizado. Músicos como Jackie Mittoo, Leroy Sibbles e Marcia Griffiths se reuniam ali para criar músicas que seriam ouvidas por todo o mundo. “Era uma verdadeira família”, recorda Griffiths. “Nós passávamos horas e horas no estúdio, experimentando novas ideias, tocando e aprendendo uns com os outros. Aquela energia criativa era única”.

    O legado de Clement “Coxsone” Dodd

    Clement Dodd faleceu em 2004, mas seu legado permanece vivo. O Studio One é amplamente reconhecido como um dos estúdios mais importantes da história da música. O impacto de Dodd na criação e disseminação do reggae e suas inovações no ska e dub deixaram uma marca indelével na cultura musical global.

    “Ele foi o grande visionário”, disse Alton Ellis em uma homenagem a Dodd. “Sem ele, a música jamaicana não seria o que é hoje. Ele abriu as portas para tantos de nós e nos deu uma plataforma para mostrar nossa arte ao mundo”.

    Hoje, o Studio One é reverenciado como o “Motown do reggae”, e seu catálogo é um dos mais influentes e amplamente reconhecidos na música popular. De Bob Marley a Sean Paul, as influências do Studio One podem ser ouvidas em praticamente todos os cantos da música contemporânea. Com milhares de gravações inéditas guardadas em seus cofres, o Studio One continua a ser uma fonte de inspiração para artistas e produtores em todo o mundo.

    LINK:

     

    “Real Rock”: o riddim que transformou o Reggae

    “Real Rock” é uma canção instrumental de reggae da banda jamaicana Sound Dimension. Gravada em 1967 e lançada como single em 1968 pelo Studio One, a faixa foi produzida por Clement “Coxsone” Dodd e contou com a participação de Eric Frater (guitarra), Boris Gardiner (baixo), Phil Callender (bateria), Denzel Laing (percussão), Vin Gordon (trombone) e Jackie Mittoo (teclados), que tocou o icônico riff de três notas no órgão Hammond.

    A importância de “Real Rock” vai além de ser apenas uma música instrumental. Ela deu origem a um dos riddims mais populares da história do reggae, sendo reinterpretada centenas de vezes por artistas de diversos gêneros, incluindo The Clash, KRS-One e 311. Em um artigo de 2004 do The New York Times, Clement Dodd afirmou que considerava “Real Rock” seu maior feito. “Real Rock é realmente forte. Está no topo”, disse ele com um sorriso. Na mesma entrevista, Dodd mencionou sucessos dos Wailers, como “One Love” e “Simmer Down”.

    O riddim de “Real Rock” se destacou por sua simplicidade hipnótica: uma nota de baixo seguida por uma sucessão rápida de notas mais leves, criando uma batida cativante e repetitiva. Gravada em uma tarde por Dodd com sua banda Sound Dimension, esse som único deu origem a um estilo de reggae conhecido como “rub a dub”, voltado para danças lentas e profundas, e rapidamente se tornou um dos riddims mais regravados na história da música jamaicana.

    “Real Rock” foi construída em torno de uma base sólida liderada pelo baixo de Boris Gardiner, com a contribuição de Phil Callender na bateria e Jackie Mittoo ao órgão. Mittoo, conhecido por seu talento visionário, inseriu acordes precisos no espaço antes da queda do baixo, definindo a estrutura hipnótica do riddim.

    A partir daí, “Real Rock” fez ondas na cena do reggae, sendo usada em diversos estilos, como dub, dancehall, punk rock e até hip hop. Sua influência foi tão abrangente que artistas de várias partes do mundo passaram a “versionar” o riddim em suas próprias canções.

    Entre as versões mais notáveis estão “Rockers’ Rock” de Augustus Pablo e “Keep In Touch” de Sizzla.

    Lista parcial de canções que usaram o riddim de “Real Rock”:
    1967 – “Real Rock” – Sound Dimension
    1973 – “Rockers’ Rock” – Augustus Pablo
    1978 – “Stop The Fussing & Fighting” – Dennis Brown
    1983 – Ababa John I (Father Majesty) – Don Carlos
    1990 – “The Real Rock” – Shinehead
    2003 – “Keep In Touch” – Sizzla
    2019 – Koffee – Raggamuffin

    Com o passar dos anos, “Real Rock” continuou a ser um pilar no reggae e em muitos outros gêneros musicais. Sua presença nas pistas de dança, nos Sound Systems e até em grandes palcos internacionais atesta sua relevância duradoura.

    Uma Ilha, Um Som, Um Mundo

    A jornada da Jamaica, de colônia britânica a nação independente, é inseparável da evolução de sua música. O Studio One, sob a liderança visionária de Clement Dodd, não apenas moldou o som de uma nação, mas também transformou a Jamaica em um centro global de inovação musical. O reggae, nascido das ruas de Kingston, ecoou pelo mundo, levando consigo uma mensagem de resistência, espiritualidade e unidade.

    “Não éramos apenas músicos”, disse Burning Spear, refletindo sobre seus dias no Studio One. “Estávamos criando algo maior do que nós mesmos, algo que uniu pessoas de todos
    os lugares. Essa era a magia do Studio One”.

    Referências:

    KENNER, Rob. ‘Real Rock’ Through the Ages. The New York Times, 23 de maio de 2004.
    BAKER, Stuart. Studio One Story [documentário]. 2003.

  • OffStep: Solução ou armadilha para o artista?

    OffStep: Solução ou armadilha para o artista?

    O sonho de ser músico e levar sua arte ao mundo está cada vez mais presente entre jovens das periferias.

    A música sempre foi uma ferramenta de expressão e resistência, e com as novas tecnologias, qualquer pessoa com acesso à internet pode gravar e distribuir suas faixas em plataformas como Spotify, Apple Music e YouTube. Nesse cenário, surgem empresas como a One RPM, com o serviço OffStep, que promete distribuir músicas em mais de 45 plataformas, mantendo 100% dos royalties.

    Mas será que esse modelo é realmente vantajoso para um jovem músico sem financiamento?

    O que o OffStep oferece?

    O principal atrativo do OffStep é seu baixo custo: 12 dólares por ano para distribuição ilimitada de músicas, mantendo todos os royalties para o artista. Em tempos de crise, isso parece tentador. A plataforma também oferece ferramentas avançadas de marketing e análise de dados nos planos intermediário e avançado, o que promete ajudar os artistas a alcançar mais público e entender o impacto de suas músicas.
    Entretanto, jovens de periferia, sem suporte financeiro, precisam analisar essas promessas com cautela.

    Ponto positivo: acesso rápido à distribuição

    Talvez o maior ponto positivo do OffStep seja a facilidade de uso. Com poucos cliques, você pode cadastrar suas músicas e distribuí-las nas principais plataformas de streaming, sem intermediários ou grandes investimentos iniciais. Para quem está começando do zero, isso pode parecer atraente.

    O músico e criador de conteúdo Nando Ramos, que promoveu o serviço, descreve: “A offstep é simples, rápida e intuitiva. Suba e distribua quantas músicas quiser, ou seja, ilimitado”.

    Essa simplicidade pode parecer uma vantagem para quem não tem experiência, mas o músico e produtor Gustavo Vasconcelos, da GRV, questiona se essa agilidade realmente beneficia o artista no início da carreira. Segundo ele, “O positivo seria o artista, no início, receber uma informação correta e precisa, ter apoio de alguém. Essa coisa da agilidade é questionável. Prefiro a alternativa que me dá mais segurança”.

    Vasconcelos critica a ideia de que agilidade, por si só, seja um benefício, principalmente para músicos que estão começando. Ele afirma que “como estamos falando de obra e música, que são patrimônios criativos do artista, não acho positivo excluir a possibilidade de uma iniciação assistida em troca de agilidade”.

    Ponto negativo: custos ocultos

    Apesar do baixo valor inicial, é importante lembrar que 12 dólares por ano podem não ser acessíveis para quem vive na periferia, muitas vezes com empregos informais. Além disso, esse valor refere-se apenas ao plano básico, com recursos limitados. Para utilizar ferramentas de marketing e análise mais avançadas, os custos sobem.

    Outro ponto a se considerar é que a One RPM, sendo uma multinacional dos EUA, mantém uma relação comercial que pode favorecer a empresa em vez do artista. Planos intermediário e avançado cobram por recursos que podem ser encontrados em plataformas mais baratas ou até gratuitas, criando barreiras para jovens músicos que não têm como arcar com esses custos.

    Dependência de empresas estrangeiras

    Optar por uma distribuidora estrangeira como a OneRPM pode significar depositar a carreira nas mãos de uma empresa que não compreende as necessidades dos músicos brasileiros.

    O mercado musical no Brasil tem suas particularidades, e grandes corporações estrangeiras podem não estar alinhadas à realidade de músicos de periferia, que enfrentam desafios financeiros e de infraestrutura.

    Alternativa nacional: a GRV como solução

    Uma solução mais adaptada à realidade brasileira é a GRV, uma distribuidora musical nacional que entende as necessidades do mercado local. Fundada em 1993, a GRV oferece suporte para músicos iniciantes e consagrados, com um serviço de distribuição eficiente e foco na música brasileira e independente.

    Além de distribuir músicas, a GRV oferece uma assessoria completa, desde o registro de músicas até o suporte jurídico, garantindo que o artista compreenda e proteja seus direitos.

    A empresa também está conectada à realidade econômica do país, praticando valores em reais, o que evita as flutuações do dólar, algo vantajoso para quem tem poucos recursos.

    GRV: uma solução completa e acessível

    A GRV se diferencia por seu atendimento personalizado e uma equipe qualificada que compreende as dificuldades enfrentadas pelos músicos no Brasil. Além da distribuição de fonogramas e vídeos, a GRV oferece:

    ● Licenciamento e comercialização de obras em mídias digitais e audiovisuais.
    ● Sincronização e clearance, facilitando o uso das músicas em filmes, séries ou campanhas publicitárias.
    ● Criação de estratégias de marketing digital, com promoção de músicas em vitrines digitais, pré-saves e campanhas promocionais.
    ● Transparência na gestão de direitos autorais, com prestação de contas trimestral e acompanhamento detalhado dos ganhos.

    Transparência e resultados

    Um dos grandes diferenciais da GRV é a transparência. A empresa se responsabiliza pela gestão de direitos autorais, garantindo que o pagamento seja feito diretamente pelas plataformas digitais, sem burocracia para o artista.

    Além disso, os relatórios de prestação de contas são disponibilizados trimestralmente na Rede Célula, permitindo que o músico acompanhe suas receitas e entendimentos financeiros com clareza.

    OffStep é para você?

    Para o jovem músico da periferia, o OffStep pode parecer uma solução rápida, mas é importante avaliar os custos e a real acessibilidade dos recursos oferecidos. O plano básico pode não ser suficiente para impulsionar uma carreira, e os planos mais completos podem se tornar caros, especialmente no cenário econômico brasileiro.

    Por outro lado, a GRV oferece uma alternativa mais justa e adequada ao mercado nacional. Com serviços pensados para músicos independentes, a empresa entende as dificuldades de quem não tem financiamento para promover sua arte e oferece soluções acessíveis e transparentes.

    Portanto, antes de optar por plataformas internacionais que muitas vezes não priorizam os interesses dos pequenos artistas, vale a pena explorar opções nacionais como a GRV, que proporciona o suporte necessário para construir uma carreira sólida no Brasil.