Rapper de Belford Roxo retoma carreira solo com músicas inéditas disponíveis nas plataformas digitais
Por DJ Fábio ACM
Eddi MC, um dos pioneiros do hip hop na baixada fluminense do Rio de Janeiro, está de volta à cena musical com o lançamento de três faixas inéditas nas plataformas digitais. Conhecido por fundar a banda Nocaute ao lado de Nino Rap, indicada ao Grammy Latino em 2002, Eddi MC segue fiel à missão de valorizar a cultura periférica e denunciar as desigualdades sociais por meio da música.
Natural de Belford Roxo, Eddi começou sua trajetória nos anos 1980, em meio ao boom do reggae na Baixada, mas foi fisgado pelo rap ainda jovem. Com uma carreira marcada por engajamento político, ações sociais e projetos literários, o rapper nunca se afastou da arte. Agora, ele se reinventa em carreira solo, com produção independente, e mostra que sua mensagem segue atual e raiz.
“Éramos Reis”: diálogo Brasil-África sobre racismo e resistência
Link: https://open.spotify.com/intl-pt/track/1vNfLocSuswr3MomNvwwWO?si=47ebe387b6764746
A primeira faixa lançada, “Éramos Reis”, é uma parceria internacional com o rapper moçambicano BIG MASTER C. Produzida por Bira Andrade, a música carrega uma lírica combativa e poética, denunciando o racismo estrutural. O encontro entre os dois artistas – um brasileiro, outro africano – reafirma os laços históricos de um povo que resiste e reivindica seu legado:
“Éramos reis, e hoje são poucos os presidentes.
Éramos reis no nosso continente, Brasil do procedente
(…)
Ao redor do mundo, ao redor do planeta
A cor do dinheiro quase nunca é nota preta”
O encontro entre as vozes de Eddi e Big Master C, reconhecido como “o rapper mais ligeiro da África”, une dicção afiada com consciência crítica, num diálogo entre continentes unidos por história e luta.
“A Baixada Nunca Se Rende”: poesia da favela vira canção
Link: https://open.spotify.com/intl-pt/track/1h1jGEj1dFtHX59yZ6t9CU?si=0ddb4d5235144347
A segunda música, “A Baixada Nunca Se Rende”, nasce de um poema da veterana Celeste Estrela, artista mineira radicada há mais de 40 anos na favela de Manguinhos. A faixa, com produção de Du-Brown, mistura ritmos da música nordestina — zabumba e triângulo — com batidas eletrônicas da Roland 808, criando um rap híbrido e poderoso.
“A Baixada sonha com igualdade social
A baixada não se rende, não
A baixada quer carinho, quer amor e atenção”
Celeste, autora do livro Coroação Preta, é símbolo da resistência cultural da favela, e sua colaboração com Eddi MC reforça a pluralidade de vozes que compõem o cenário artístico da Baixada. A canção é um hino à periferia, à luta por dignidade e ao afeto que nasce em territórios constantemente estigmatizados.
“Beatbox – o sexto elemento”: rap e rock para celebrar o hip hop
Link: https://open.spotify.com/intl-pt/track/55dQUuu27OE74yD0WyVt86?si=15a4c503eafe4c5f
A terceira novidade é “Beatbox – o sexto elemento”, faixa que reúne o rap com o rock — marca da antiga banda Nocaute — e presta homenagem ao beatbox, elemento fundamental da cultura hip hop. Produzida por Du Brown, a música conta com a participação do guitarrista Jailson Lisboa, também da Baixada (São João de Meriti), e evoca a tradição de unir estilos como fizeram Run DMC e Aerosmith em 1986.
“Rap, DJ, break, conhecimento, grafite, beatbox – sexto elemento
O beatbox dá um clima na roda
Bota as ruas no centro, por isso que incomoda”
A faixa celebra a inventividade do beatbox como caixa de som humana e reforça o papel do hip hop como movimento educacional e ancestral.
Ainda sobre o Beatbox, Eddi MC lançou em 2007 o curta-metragem Beat Box – O Sexto Elemento, produzido de forma independente no morro do Cantagalo, no Rio de Janeiro. O filme registra uma versão do Hino Nacional em ritmo do rap, interpretada por crianças de um projeto social da comunidade. Com menos de 15 minutos, o curta foi exibido em festivais no Brasil e na Holanda, e reforça o poder transformador da cultura hip hop e das tecnologias acessíveis no audiovisual.
Para assistir, acesse o link: https://www.youtube.com/watch?v=bF5TN-78YVI
Resistência, arte e história viva
Além das novas músicas, Eddi MC segue ativo como escritor e militante cultural. Ele é autor de um capítulo no livro A Força das Falas Negras e integra o coletivo Baixada Nunca Se Rende, voltado à valorização dos artistas e da produção cultural da região.
O retorno de Eddi MC não é apenas musical: é um manifesto. Sua voz ecoa por escolas, favelas e centros culturais da Baixada, reafirmando que o hip hop continua sendo ferramenta de transformação e resistência.
Os três singles já estão disponíveis nas principais plataformas de streaming. Para quem acompanha a história do rap nacional e valoriza a força da cultura periférica, esse é um retorno que merece ser celebrado — e ouvido no volume máximo.
Sobre o Beatbox: a bateria humana da cultura Hip Hop
O beatbox é uma forma singular de expressão musical, nascida dentro da cultura Hip Hop nos anos 1980, em Nova York. Trata-se da arte de criar batidas, ritmos e sons apenas com o uso da boca, lábios, língua, garganta e passagem nasal. Segundo Kuhns (2014), o beatbox simula os elementos da percussão, utilizando o corpo como instrumento — por isso, também é conhecido como instrumento humano. Geralmente, é praticado por MCs e outros integrantes do Hip Hop que exploram ao máximo as possibilidades sonoras da voz.
Inspirado nas drum machines, caixas eletrônicas de ritmo que eram caras e inacessíveis à juventude negra e periférica, o beatbox surgiu como uma alternativa criativa e acessível. Daí vem o nome “Human Beatbox”: pessoas que imitavam os sons dessas máquinas com a própria voz.
Artistas como Doug E. Fresh e Darren “Buffy” Robinson, do grupo Fat Boys, foram pioneiros no uso da técnica, ajudando a expandir sua popularidade e sofisticação. Outros nomes como Bobby McFerrin também contribuíram para o desenvolvimento da arte vocal em outros gêneros, como o jazz.
No Brasil, o beatbox ganhou força a partir dos anos 1990 e 2000, com nomes como Fernandinho Beatbox, de São Paulo, e Fábio Carrão, do Rio de Janeiro, que se destacaram em batalhas, shows e oficinas educativas, formando gerações de novos beatboxers.
Os elementos básicos do beatbox são o bumbo, a caixa e o chimbal. O bumbo é produzido com pressão labial e explosão de ar ao pronunciar letras como “p” ou “b”. A caixa vocal se aproxima do som agudo de uma tarola, usando variações como “pf”, “psh” ou “ps”. Já o chimbal simula pratos de bateria e pode ser criado com as consoantes “t”, “k” ou “ch”.
Referências:
BETHÔNICO, Jalver. Beatbox em Loop: Crescimento de ideias e seu desdobramento na arte digital e no design sonoro. Texto Digital: Florianópolis, v. 5, n 1, p.248-275, jul. 2013.
DEHNHARD, Tilmann. Tilmann Dehnhard: Flutebeatboxing for flute. Universal Edition, 2015.
KUHNS, Christopher. Beatboxing and flute: Its history, repertoire, and pedagogical importance. Tese de doutorado em música, Frorida State University College of Music, Florida, 2014.
VÁZQUEZ, Óscar. Método de Flutebox: El método para aprender y enseñar flauta beatbox. Espanha, Guzmán el bueno, 2017.
Revista África e Africanidades – Ano I – n. 2 – Agosto. 2008 – ISSN 1983-2354
LUDDENS, Douglas. Celeste Estrela. Wiki Favelas – Dicionário de Favelas Marielle Franco.
Disponível em: https://wikifavelas.com.br