sexta-feira, 29 março, 2024

Nova Iguaçu sitiada

Já tinha terminado o texto da minha coluna quando recebi algumas mensagens dizendo que estava havendo um tiroteio terrível em Austin – bairro aqui de Nova Iguaçu. Mudei minha coluna, que falaria de empreendedorismo na música, para escrever novamente sobre o aumento do índice de violência na Baixada Fluminense, pois considero importante essa discussão aos pés de uma eleição e aos pés de um evento internacional como a Copa do Mundo.


 Sou nascido e criado em Morro Agudo, Nova Iguaçu.

Na minha adolescência era inimaginável a notícia que li hoje no site do G1: – Na ação foram apreendidos dois fuzis, uma metralhadora, um revólver, uma pistola, um veículo roubado, sete carregadores, três radiotransmissores, uma luneta (equipamento que é acoplado no fuzil) e um caderno de anotação do tráfico. O caso vai ser registrado na 58ª DP (Posse).

Há cerca de dois anos, quando meu tio chegava em casa, foi surpreendido por três assaltantes fortemente armados, que levaram o seu carro. Isso aconteceu na minha rua, em frente a minha casa. Quando fomos atrás para saber o que havia acontecido, os policiais, que conseguiram prender os bandidos em Belford Roxo, disseram que eles eram de uma favela do Rio de Janeiro que acabava de receber uma Unidade de Polícia Pacificadora. Vieram para a Baixada, para roubar carros, fazer assaltos, conseguir armas e “tomar” uma outra favela de uma facção rival.

Já naquela época eu acenava para um grande problema na região. Muitos disseram que eu estava exagerando.

Há uns dois meses, quando eu estava na faculdade, minha filha me ligou dizendo que havia toque de recolher na comunidade, que era para eu voltar rápido para casa. Logo depois o Samuca Azevedo me ligou dizendo a mesma coisa. Em seguida recebi outra e outra ligação, de amigos preocupados com minha segurança. Eram bandidos que estavam na comunidade e queria implantar uma boca de fumo em uma comunidade próxima. A polícia chegou e houve tiroteio.

Pra mim está claro que Nova Iguaçu – e toda a Baixada Fluminense – não é prioridade quando o assunto é Política de Segurança Pública. Não é que estamos em segundo plano, nós não estamos “no plano”.

UPPs comparação com BPMs

O que você sente quando lê uma matéria como a da jornalista Maria Inês Magalhães, para o Jornal O Dia, que diz o seguinte: – Áreas pacificadas têm mais PMs que toda a Baixada Fluminense. UPPs têm 4.360 policiais militares para 200 mil moradores. A Baixada Fluminense, região com 3.651.708 habitantes em 13 cidades conta com 2.910 agentes.

Em outra matéria, o jornalista Leandro Prazeres, para o site UOL, diz o seguinte: – […] a Baixada Fluminense viu um aumento de 25% no número de homicídios dolosos, saindo de 1.381 em 2012 para 1.728 em 2013. O percentual é quase o mesmo das tentativas de homicídios, que subiram 26% entre 2012 e 2013.

Hoje é apenas uma evolução do que já está sendo anunciado a alguns anos. Quando eu questiono a você sobre a Copa do Mundo, eu não estou surfando em uma onda do #NãoVaiTerCopa, estou querendo discutir as implicações que o evento traz pra nós. O legado que fica para nós é esse, porque o governador do Estado quando põe UPP nas favelas do Rio de Janeiro, em uma época pré-copa, não está preocupado com a população das favelas, ele está preocupado com a segurança dos gringos e com a imagem dele e do Estado. No final, tudo é por dinheiro.

Os bandidos que trocaram tiro com a polícia hoje aqui em Austin, segundo informações que obtive, vieram do morro Chapadão e ocupara o Morro Mirando Leal. Pela manhã foram roubar a casa de um comerciante do bairro, que chamou a polícia e desencadeou a série de mortes e perseguição, deixando a população desesperada e sem um posição real do que está acontecendo.

O saldo de hoje?

  • 01 policial morto (morador de Austin);
  • 01 policial ferido (meu vizinho, morador de Morro Agudo);
  • 04 bandidos mortos;
  • 01 bandido ferido (mas vai morrer, porque foi pro Hospital Geral de Nova Iguaçu);
  • 02 bandidos presos;
  • 804.815 pessoas amedrontadas.

Como resultado:

  • A população que já tinha dezenas de problemas, agora tendo que se preocupar com a própria segurança;
  • Milicianos se aproveitando do descaso do poder público;
  • Candidatos (como o Garotinho) se aproveitando da situação e já tentando marcar reuniões com as lideranças locais.

ESTAMOS NOVAMENTE NA MÍDIA, DAQUELE JEITO QUE SÓ AS MAZELAS SÃO MOSTRADAS:

 

Sobre Dudu de Morro Agudo

Rapper, educador popular, produtor cultural, escritor, mestre e doutorando em Educação (UFF). Dudu de Morro Agudo lançou os discos "Rolo Compressor" (2010) e "O Dever Me Chama" (2018); é autor do livro "Enraizados: Os Híbridos Glocais"; Diretor dos documentários "Mães do Hip Hop" (2010) e "O Custo da Oportunidade" (2017). Atualmente atua como diretor geral do Instituto Enraizados; CEO da Hulle Brasil; coordenador do Curso Popular Enraizados.

Além disso, veja

O conflito de gerações no rap brasileiro: Uma análise das críticas e desafios

Para onde o rap brasileiro está caminhando? Essa é a pergunta que venho me fazendo …

01 comentário

  1. Cára, eu também me preocupo. Antes de parar em casa eu verifico se não tem ninguém me seguindo, outro dia tinha, e não fico perto do carro quando saio. Se quer roubar o carro, pode roubar, eu me preocupo com a segurança da minha família. Essa Baixada de hoje me faz sentir saldades dos grupos de extermínio, quando morria um monte de gente, mas você sabia, mais ou menos, porque e quem seria o próximo. Hoje morre gente sem quê, nem porque e assalta e vende drogas e sei lá mais o quê. Só falta o #Governador mandar o capeta pra cá, porque os bandidos eles já estao mandando. Quem faz acordo com bandido, boa gente não é! Vai vendo!

Deixe uma resposta para DumonttCancelar resposta